Anita Philipovsky

Textos:
Os poentes da
minha terra*
A Stefan Kujavski
( Stefan, não sei onde te achas atualmente.
Mas tenho a esperança de que possas ler
estes versos que fiz pensando no teu fino
espírito, que tanto aprecia tudo o que de
belo nos oferece a Natureza! )
Os
poentes da minha terra
São
belos,
Tão
belos,
Mas
tão belos
Como
ninguém viu fora daqui.
Uns
são roxos . . . outros amarelos . . .
Outros
de bronze com pedrinhas de rubi . . .
E
os cor de opala, então ?
Lembram
a palheta de algum pintor flamengo
As
nuanças leves de um pôr-de-sol assim.
E
os de seda cor-de-rosa ?
E
os poentes de verão ?
Às
vezes o poente de verão
É
todinho borrado de carmim.
Há
os de nuvens frágeis, esgarçadas.
Tocadas
de luz desfalecente.
E
a essas nuvens leves,
E
luz desfalecente,
A
gente olha e pensa . . .
Fica
pensando que o ocidente sonha
Sonhos
de renda, de gaze e nostalgia,
Sonha
saudades para magoar a gente.
Patéticos
. . . Uma rima de saudade,
Um
verso do poema – nostalgia . . .
Tonalidades
de exótica poesia,
De
poesia apenas pressentida
Através
do tempo e através do espaço. . .
Patéticos.
Legendários. Quase irreais . . .
Estes
poentes às vezes são assim.
Neles
canta, e numa voz que ninguém ouve,
Um
noturno . . .
Canta
inaudível a alma de Chopin.
Sentimentais
. . . muito sentimentais,
Estes
poentes às vezes são assim.
E
às vezes . . ah! são exaltados !
De
cariz violento. Rubros ! De tragédia !
Esbraseados
. . .
São
chamas ! . . .
Vede
então – o ocaso pegou fogo !
Há
um grande incêndio onde termina o céu.
E
logo mais:
Feitos
de chumbo, azinhavre e de zarcão,
Com
faíscas medrosas de safira.
E
nesses dias,
Que
colorido onde entra o Sol!
Que
cores fortes !
E
do contraste agressivo dessas tintas,
Furiosas
e terríveis,
O
Sol se esquiva: o Sol vai fugindo,
O
Sol se escapa como quem delira.
Poentes
extravagantes !
Poentes
indescritíveis !
Até
parece que o céu enloqueceu.
Agora
vede:
Negro
e de sangue . . . de tragédia, um dia,
E
outro dia,
Um
pôr-de-sol suave e dolente,
Que
a alma da gente veste de cisma,
E
que veste de cisma a alma da gente.
Poentes
extravagantes !
Poentes
indescritíveis !
Sobre
a magia desses coloridos
Expressou-se
arrebatado certa vez
Um
espírito vibrante de estesia.
Era
sem saber que o era – um poeta.
Mas
falou:
“Nesta
terra é assim:
Quando
termina o dia,
U’a
mão invisível, misteriosa,
Pinta
onde acaba o céu,
E
com as tintas que quer,
Pinta
tudo o que há de emocionante,
Na
essência emocionante da poesia.”
Assim
expressou-se embevecida, um dia,
Uma
alma vibrante de estesia.
E
o poente de hoje, não vistes ?
Foi
imponente. Foi egrégio.
O
rei dos astros quando foi-se embora.
Deixou
no céu o lindo manto seu .
Era
de púrpura, que eu sei,
Com
franjas de ouro, e bordados de ouro,
Mesmo
um manto de rei.
Portanto
esse presente foi um presente régio.
Afinal
Ponta Grossa pode usar,
Como
usa, e muitas vezes usa,
Na
hora crepuscular,
O
ouro e as púrpuras das galas reais.
Porque
– quem não sabe da sua nobreza ? –
Ela
é princesa.
É
soberana.
E
os seus domínios ?
É
toda a terra dos Campos Gerais.
E
por isso ela tem a regalia
De
usar a púrpura das galas reais.
Estes
ocasos . . .
Cada
um tem sua beleza peculiar, eu acho.
Os
outros . . . não sei que pensam, nem o que dirão.
Mas
para mim o pôr-do-sol mais sugestivo
E
emotivo,
É
o pôr-do-sol lilás.
Quando
faz fundo para uma paisagem campesina,
É
de tão grande beleza,
E
de tristeza tal,
Que
a impressão que causa, não há quem a defina,
Na
lomba da coxilha há um pinheiro isolado,
Forte
e dorido na sua solidão.
Altivo.
Sobranceiro. Algo de audaz . . .
Esse
pinheiro sobranceiro,
O
vento embate-o. Ele resiste.
Luta
com o elemento hostil, ele sozinho,
Deslembrado
na verde imensidão
Do
campo sem fim.
Na
lomba da coxilha há um pinheiro isolado . . .
E
por detrás,
Muito
atrás
Da
curva da coxilha,
O
céu a agonizar em cor lilás.
Só
lilás ?
Não.
Bem pertinho do horizonte,
Há
uns fiapinhos de nuvens enxofradas,
Cloróticas.
Agoniadas.
Parecem
doentes essas nuvens fininhas.
Isto
bem pertinho do horizonte.
O
mais é só amaranto. É só lilás.
É
tarde. É o fim de um dia que não teve sol.
A
gente olha isso tudo, e fica olhando.
Fica
cismando em tanta coisa . . .
A
dor da ausência fica doendo mais.
Um
fim de tarde assim,
Como
faz sentir !
Como
faz pensar !
Faz
pensar nas almas incompreendidas,
Esmagadas
de incerteza e de pesar,
Essa
árvore sozinha, tão sozinha !
E
o céu a agonizar clorótico e lilás.
Mais
uma nota triste, nesse quadro:
Lá
longe há um aterro.
E
nesse aterro,
Um
cavalo sacoleja um cincerro.
A
gente olha ainda:
O
dia se desfaz
Doente
e lilás
O
campo é triste !
O
pinheiro é triste !
[
O cincerro é triste ! ]
Meu
Deus onde vai parar essa tristeza ?
E
essa beleza ?
Ouvi
! Andam soluços soluçando no ar . . .
A
gente olha, e tem vontade de chorar.
Minha
terra tem cada poente !
É
um dom que igual, nenhuma terra tem.
Muitas
vezes ao findar do dia,
Na
horinha em que vai baixando o Sol
Entre
nuvens leves como véu,
É
só ver:
Aperta
o coração da gente, uma saudade !
Uma
saudade diferente . . . não sei como,
Não
é saudade de nada desta vida.
É
coisa incompreendida
Talvez
seja a nostalgia indefinida
Que
a gente tem do céu.
Poentes
da minha terra !
Quando
longe de vós, para vós é a minha saudade. . .
Poentes
da minha terra, que fazeis pensar !
Poentes
da minha terra, que fazeis sonhar !
Poentes
da minha terra, que fazeis chorar !
Ponta Grossa – Janeiro de 1936.
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