Verbete organizado
por:

Anselmo Peres Alós

 



Claudina Pereira de Pereira 

 

Vida:

                Internada no Hospital Psiquiátrico São Pedro de Porto Alegre (HPSPPA) pela primeira vez aos 23 anos, Claudina foi acostumando-se ao ambiente do sanatório e às internações cada vez mais freqüentes. Depois de viver junto de parentes, de tentar trabalhar e sustentar-se, e finalmente cair na mendicância e rolar no mundo, a poeta voltou mais 22 vezes ao HPSPPA, sendo abandonada pelos parentes e rejeitada pelo marido. Diagnosticada como esquizofrênica paranóide, encontrou no ato de escrever a possibilidade de uma existência mais branda. Alma no espelho, seu único livro publicado, é uma coletânea de poemas organizada por Ayrton Centeno, publicada pela Secretaria Municipal de Cultura de Porto Alegre na série Outras Vozes, que tem o objetivo de dar visibilidade ao depoimento de sujeitos sociais marginalizados que registraram modos outros de ver o mundo através do texto ficcional.

 

                Em sua poesia, várias vezes é retomado o questionário, tal como utilizado pelas colegiais em meados dos anos 60. Verticalizados pela estrutura dos poemas, esses questionários desestabilizam o leitor: “Que é marginal? / Posso tudo? / Vê se eu posso?” (poema intitulado “Três perguntas”). Nesses versos de Claudina, faz-se presente a indagação sobre o jogo de poder, na tentativa de compreender como funcionam as excludentes regras das concepções hegemônicas da normalidade.

 

                Da mesma forma que a poesia hai-kai japonesa, a lírica de Claudina surpreende pelo inusitado de seus finais. Mas, ao contrário daquela, possuidora de uma métrica rígida e de uma temática que envolve quase que exclusivamente as cores da natureza e a passagem das estações do ano, a produção de Claudina não obedece a métrica alguma. Seus versos livres, brancos na maioria das vezes, falam também da natureza, mas da natureza intrínseca ao eu-lírico, muitas vezes atemorizam o leitor através de uma percepção ácida e perturbante da ordem do real. Mais atemorizantes ainda quando levamos em consideração o fato de seus originais terem sido escritos no verso de velhos prontuários e receituários do próprio HPSPPA[1].



[1] Apesar das tentativas de contato com a administração do HPSP, não foi possível identificar dados biográficos precisos. Da mesma forma, não foi possível localizar nenhum dos parentes de Claudina, os quais poderiam fornecer dados concretos sobre a vida da poeta.