maioria dos autores
que se referem a Josefina Álvares de Azevedo – de que ela
era irmã, por parte de pai, do famoso poeta Manoel Antônio
Álvares de Azevedo (1831-1852) e que nascera em Itaboraí
(RJ) –, depoimentos pessoais da autora, localizados recentemente
nas páginas do jornal A Família (1888-1897),
indicam que ela era natural de Recife (PE) e que Álvares
de Azevedo era seu primo e não seu irmão. Quanto
à data do seu nascimento, 05 de março de 1851, não
há divergências. Já sobre outros fatos de
sua vida pessoal, sabe-se que ela foi mãe exemplar e que
viveu em Recife até os 26 anos, mas não há
registros sobre o nome de seus pais, a data e o local de sua morte,
seu estado civil, quantos filhos teve, como passou sua infância
e juventude, onde fez seus estudos.
Em compensação,
sua obra jornalística e literária, produzida essencialmente
em função da sua militância pelos direitos
da mulher, é um retrato quase completo do que foi sua vida.
Sua prosa (artigos, contos, esboços biográficos,
traduções), seus versos, sua dramaturgia – praticamente
tudo o que escreveu e publicou foi com um único objetivo:
intervir na ordem social e política do seu tempo de modo
a criar condições mais justas e igualitárias
para os dois sexos.
Tendo saído
da terra natal em 1877, já no ano seguinte, então
radicada em São Paulo, manifesta-se em defesa da emancipação
social da mulher. No final de 1888, nessa mesma cidade, funda
o jornal A Família, transferindo-o, seis meses depois,
para o Rio de Janeiro, onde o faz circular regularmente até
1897-98.
Nas páginas
desse jornal, a primeira causa que defendeu em prol da elevação
do status das mulheres na sociedade brasileira, a exemplo
do que também fizeram algumas outras feministas pioneiras,
foi a educação. Radical como talvez nenhuma outra
de suas companheiras do final do século XIX, reivindica
para o sexo feminino um tipo de educação que desenvolva
sua capacidade para exercer não só a direção
da família, mas também as mais altas funções
de Estado.
Em meados de 1889,
determinada a expandir e fortalecer sua propaganda pela libertação
das mulheres, empreende uma viagem pelo Nordeste do país,
onde visita escolas públicas e particulares, repartições
públicas e escritórios de vários jornais,
fazendo diversos contatos, visando sempre conquistar mais leitoras
e leitores para A Família e, obviamente, mais adesões
e simpatias para a causa que abraçava.
Após a proclamação
da República, A Família passa a defender
também o direito de voto para as mulheres e sua redatora-chefe
faz dele um autêntico veículo panfletário.
Entre várias outras matérias relacionadas, publica
uma série de artigos sob o título O direito de
voto, neles expondo sobretudo sua convicção
de que, sem esse direito, a igualdade prometida pelo novo regime
político não passava de uma utopia.
Daí em diante,
suas iniciativas serão no sentido de ampliar ainda mais
e principalmente diversificar os espaços utilizados para
suas batalhas pelo direito eleitoral das mulheres. No início
de 1890 publica o opúsculo intitulado Retalhos,
em que reúne vários dos seus artigos já publicados
no jornal, entre eles os da série citada e outros relativos
à educação feminina.
Pouco depois, instigada
sobretudo pela negativa do governo em incluir a lei do voto feminino
no Projeto da Constituição que se elaborava, escreve
uma comédia intitulada O voto feminino, que faz
representar em maio do mesmo ano. Embora bastante aplaudida –
e, aliás, elogiadíssima pela imprensa antes da representação
–, a comédia não volta ao palco. Mas a urgência
de continuar pressionando as lideranças do país
para que a nova Carta não fosse omissa como a anterior
quanto aos direitos civis e políticos das mulheres aguça
o senso estratégico da autora, que encontra alternativas
para exibir sua comédia de novo. E em seguida a peça
reaparece em cena – dessa vez em forma impressa, como livro e
como folhetim nos rodapés de seu jornal e ainda uma terceira
vez, como parte de uma coletânea, A mulher moderna: trabalhos
de propaganda, publicada no ano seguinte, quando a Constituinte
ainda se encontrava reunida.
Em termos de eficiência
com relação aos seus objetivos, o fracasso d’O
voto feminino é evidente, pois como se sabe as mulheres
brasileiras só conquistaram o direito de voto em 1932,
quer dizer, quase meio século depois dessa tentativa pioneira.
Por outro lado, em termos de eficiência com relação
ao uso das técnicas de dramaturgia, a comédia é
um sucesso. Apesar do fôlego curto e certas fraquezas de
composição, seus diálogos têm vivacidade,
suas personagens são convincentes, seu humor é afiado
e inteligente. Mais que isso, a inclusão de alguns dos
recursos formais e estilísticos que mais tarde viriam a
compor o perfil do teatro de agit-prop, faz d’O voto
feminino uma peça que antecipa em mais de meio século,
a experiência mais efetiva desse teatro no Brasil, só
realizada no início dos anos Sessenta pelo movimento teatral
do CPC (Centro Popular de Cultura) da UNE (União Nacional
dos Estudantes). Usado abertamente como instrumento de agitação
e propaganda na luta pelos direitos políticos das mulheres,
O voto feminino impõe-se como emblema do feminismo
no Brasil em sua fase inicial.
Um dos últimos
registros a respeito de Josefina Álvares de Azevedo é
a publicação, em 1897, de sua terceira coletânea,
intitulada Galeria ilustre: mulheres célebres. Em
formato semelhante ao então usado por autores masculinos
para colecionar figuras exemplares de homens notáveis e
mulheres virtuosas, essa Galeria de celebridades femininas
sinaliza claramente para os novos papéis sociais imaginados
por sua autora para as brasileiras, ao expor retratos de famosas,
entre elas rainhas e figuras políticas, além de
outras nada exemplares para os padrões da época,
como Cleópatra e George Sand.
Após 1899,
quando se publica na revista A Mensageira o artigo Solidariedade
feminina traduzido do francês por Josefina de Azevedo,
nenhuma outra referência é feita a seu respeito.
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