Verbete organizado
por:

Constância Lima Duarte e Diva Cunha

 



Sinhazinha Wanderley


Textos:

 

Auto-retrato

Eu sou um ser pequeno, amorenado,

De óculos ao nariz e pisar manco,

O cabelo cortado e todo branco,

Sou mesmo um tipo amarmotado.

Trajo vestido azul já desbotado,

Nunca rio, meu riso não é franco,

Evito tropeçar nalgum barranco

Por ter um pé já quase deslocado.

Uso tênis, um par em cada mês,

Eu os compro a Xandu a cada vez

Que os outros estão esburacados.

Passeio nas calçadas, pau na mão,

Procurando fazer a digestão

Quando engulo à tardinha algum bocado.

 

Assu, às 11 do dia

São horas de almoçar, há movimento,

Badala no Mercado uma sineta,

Há gente pelas ruas, na valeta

Um pequeno tropeçar e, no momento...

Um carro a buzinar corre violento,

Um preto a pedinchar uma gorjeta

Compra Aguardente em vez de alimento!

Há silêncio nos lares. Nos hotéis

Engenheiros, bancários, coronéis,

Vão fazer sua farta refeição,

Enquanto um pobre ser, acocorado,

Tira do "caco" um sebo mal torrado

E o põe a misturar-se no feijão...

 

O meu aniversário

Cinqüenta e dois degraus hoje subi!

Íngreme escada!

Quase tremi de susto!

E, vacilante, à custo,

Lentamente a galguei! Eis-me estafada!

Lá da escola onde ensino, a petizada

Com meigos risos francos,

Diz cheia de alegria:

Faz anos neste dia,

A nossa mestra;

A de cabelos brancos.

Lírios róseos de Éden de minha alma

Pequenos infantis,

Dourados colibris,

De carícias de arminho,

Guardai vosso carinho

(Do qual não tenho zelos).

Nem mesmo o vosso riso,

O sol de um paraíso,

Pôde "aquecer-me a neve dos cabelos".