Verbete organizado
por:

Luciana Fonseca

 



Rosália Sandoval

 

Textos:

Na alfombra esmeraldina da lagôa

Beijando a flor de golpho perfumosa,

Corre a linda barquinha pressurosa

Como as azas de um pombo que revoa

 

Pela amplidão azul do ar reboa

Uma canção alegre, radiosa

Bella, sadia, leda, vigorosa

De alvo piloto que commanda á proa.

 

A branca vela desfraldada ao vento

Arreia o marinheiro pachorrento

De blusa azul e calça de riscado

 

E a casquinha de noz foge mimosa

Como um sonho garrujo, cor de rosa

Que voa prazenteiro, ennamorado.

 

 

PERIÓDICO: CORREIO DE ALAGOAS, 27 DE ABRIL DE 1905

TÍTULO: BORBOLETAS (ao poeta J. Eustachio de Azevedo)

AUTORA: ROSALIA SANDOVAL

TIPO: SONETO

 

Sahi de manhã cedo. Pelo Prado

havia um cheiro agreste de buninas,

Ao frescor das aragens matutinas

cantava alegre um trovador alado.

 

E um bando eu vi garrido e delicado

de borboletas louras e franzinas

a se erguer da verdura das campinas,

buscando o espaço pelo sol dourado.

 

E eu disse, vendo-as assim loucas n’essa

tentação de deixar a nossa esphera:

- “onde vão? Onde vão com tanta pressa?”

 

- Ah! ... a vida é tão curta! responderam

“e queremos gozar a Primavera ...”

E revoando ... e subindo ... se esconderam.

 

PERIÓDICO: O ABC (órgão literário e noticioso), 15 de dezembro de 1908

TÍTULO: A MISS MARY

AUTORA: ROSALIA SANDOVAL

TIPO: SONETO

 

Cantam as aves, riem-se as violetas,

Palpita de prazer a brisa mansa,

Há no luar affluvios de uma esp’rança,

Entoa o nauta alegres cançonetas.

 

Espelha-se noazul em céo d’estio

O sorriso ideal da natureza,

Sonha alegre e innocente camponeza,

Co’as crespas ondas do formoso rio.

 

Rescendem os jasmins: os passarinhos

Tambem sonham amor, gosam ventura.

Na doce intimidade dos seus ninhos.

 

Tudo é goso, prazer e amenidade:

Só minh’alma se estorce na amargura,

E se envae no gemer d’uma sadade! ...

 

PERIÓDICO: O DIÁRIO, 01 DE ABRIL DE 1931

TÍTULO: AMOR

AUTORA: ROSÁLIA SANDOVAL

 

“Amae-vos uns aos outros” _ disse Cristo,

pregando ás turbas suas leis de amor,

E eu procurava a realidade disto ...

Amor! eu o busquei por toda parte...

_ Na alegria, na dor,

                          nos domínios da Arte...

 

Das flores na linguagem perfumada,

dos ninhos na canção, na soledade,

das estrellas no pranto ...

Na borbôleta alada, no inseto multicor,

                          no crepúsculo, na luz...

 

Por toda a natureza o procurei,

Tudo fallava do celeste encanto

                          da fhrase de Jesus.

 

Mas, oh fatalidade!

Amor! ... onde menos o encontrei!

foi no coração da humanidade!

PERIÓDICO: O DIÁRIO DE MACEIÓ, 17 DE AGOSTO DE 1933  

TÍTULO: NO FIM ...

AUTORA: ROSÁLIA SANDOVAL

 

Eu desejo morrer, quando o sol no ocidente

Fingir de ouro e de Rosa a serrania longe,

quando o “angelus vestir de saudade o ambiente

e o sino ressoar sua oração de monge.

 

Que delicia morrer numa tarde de sol

tendo junto do leito uma flor a morrer!

a vida a se extinguir, como o louro arrebol

que veste num fim da tarde, ao quasi anoitecer.

 

Findar a vida assim, numa dolência suave,

num adeus sem tristeza, é melhor que sonhar.

Quem me dera morrer, Como um gorgeio de ave...

sem  chorar nem sorrir, só pensando em me alar.

 

Morrer! ... oh que ilusão! A morte é reviver

de um sonho que se quis e nunca se alcançou.

É o despertar da vida, é o lindo alvorecer

da verdade feliz que a vida nos negou.