Verbete organizado
por:

Luísa Cristina dos Santos

 



Maria Cândida de Jesus Camargo

 

Textos:

O DUETO

 

De madressilvas, ramos flutuantes

Adornavam as janelas de festões,

Ouvia-se de um piano os sons vibrantes

De um harmonioso dueto, as variações.

 

De vozes juvenis suaves e amantes,

Produzindo alegres sensações

Em acordes sonoros e cantantes

Seguindo musicais modulações.

 

Diáfano brilho  iluminava a sala

Como se a luz do sol em grande gala

Viesse aplaudir afável, com agrado,

 

O mavioso dueto matinal

Que do sol, ao afago festival

Talvez fosse o prenúncio de um noivado.

 

QUEIMADAS

 

Torna-se o ar de todo enfumaçado

Pelas queimadas recentes? Na vivenda

Reúnem-se os campeiros  no alpendrado,

Para o repouso  e a frugal merenda.

 

Fumam, conversam, e um diz: Bem embrulhado

Está o negócio da compra da Fazenda

E o outro responde: Certo, o advogado

Vem, afim de impedir que haja contenda.

 

As mulheres escutam, e sorrindo

A mais velha observa — indo e vindo:

E não se apoquentar, pôr-se de fora

 

Fala o dono  da casa: — A prosa é boa,

Mas voltemos ao campo, e vê patroa

Se nos manda o café, que está na hora.

 

SAUDADE

À memória de minha querida e sempre pranteada amiga, Laura Alves Carneiro, falecida a 25 de março  de 1888 em Imbituva, Estado do Paraná, aos 17 anos de idade.

 

Lamentos, prantos, pesar e martírio

Lembrando a morte dessa virgem casta,

Levou-a Deus e ela está no empíreo

Longe dos males que a existência arrasta

 

Ah! Flor modesta que a terrestre veiga

Amenisaste como aroma puro,

Ah! Quem pudera ao ver-te alegre e meiga

Adivinhar o teu fim prematuro.

 

Um golpe imenso ao coração materno,

Urna que guarda inexaurível dor,

Unindo  sempre ao sentimento eterno

Um canto amargo de saudade e amor!

 

Resignar-se? Que palavra fria

Resta a uma alma angustiada assim...

Resignar-se! Se a morte sombria

Roubou-te  ó flor, p´ra o celestial jardim:

 

Ah, mas quem sabe, se um mandado augusto

Altos mistérios do poder de Deus,

Arrebatou-te a um destino injusto

Asas te enviando para voar aos céus.

 

.........................................................................

 

Não; não choremos; ela foi ditosa

Virgínea rosa encantadora e casta,

Deus transplantou-a aos cerúleos  vales.

Longe dos males que a existência arrasta.

 

Deixou o tredo labirinto escuro,

Já o futuro a não assombra mais,

Ave inocente, procurou asilo

Almo e tranqüilo onde  não se ouvem ais.

 

E no entanto a saudade infinita

Meu peito agita, cruciante, atroz!

Enfebrecido o pensamento foge

Um canto hoje, ah que me dera voz!

 

Se não me esqueço dos passados dias

Das alegrias que o seu lar perdeu!

Tudo que vejo, tudo quanto existe

Recorda triste, que ela já morreu.

 

Morreu criança, abandonou a terra,

Lodo que aterra, a quem aspira à luz,

Foi tão amável inocente e boa

Áurea coroa, lhe dará Jesus!

 

A CANTIGA SERTANEJA

 

Na toada da cantiga sertaneja

Ao som dolente  que a viola acompanha

Uma queixa talvez o quer que seja

De um oculto sentir, a força estranha

 

Que a alma simples interpretar deseja

De indefinível nota mágoa tamanha,

Que se revela em ais! Quando negreja

A noite, que às vezes na mata o acompanha

 

Quando  à procura d´um perdido animal

A ventania o assombra no mundo florestal,

Ou quando no rio joga o anzol aos peixes

 

Que magia o inspira, encoraja e consola?

    A mulher e os filhos e o cantar da viola

“Meu bem fugiu...”    “O sabia morto“  o  “Não me deixes”